quarta-feira, setembro 23, 2009

Declaração política sobre o Plano de Urbanização Almada Nascente

Começamos por esclarecer que consideramos a elaboração do Plano de Urbanização de Almada Nascente (PUAN) uma iniciativa municipal, obviamente, legítima e meritória!

Assim como, atendendo a que o PUAN é um assunto de evidente interesse para os cacilhenses, não só por se situar no perímetro geográfico da nossa freguesia mas, principalmente, pelos significativos impactos ao nível do planeamento urbano e sócio económico que o mesmo irá ter nesta zona do concelho de Almada, não podemos deixar de abordar este tema nesta Assembleia, embora estejamos conscientes de que não cabe a este órgão colegial deliberar sobre a sua aprovação.

Julgamos que, todavia, sendo este o órgão autárquico mais próximo dos cidadãos, os seus membros também deveriam ter uma palavra a dizer sobre tão importante projecto e, por isso, resolvemos, a título de declaração política, tecer algumas considerações sobre a matéria.


Com efeito, uma vez consumado o encerramento dos Estaleiros da Lisnave na Margueira, processo a todos os títulos traumático para a cidade de Almada e a região, e contributo significativo para a desindustrialização da Península de Setúbal, que tão negativamente marcou as últimas décadas da nossa vida colectiva, impunha-se naturalmente que a Cidade repensasse o papel da sua Frente Ribeirinha Nascente, não permitindo que o enorme baldio industrial da Margueira (55 ha) se somasse aos abandonados Cais do Ginjal e Estaleiros da Parry, e aos degradados Silos do Caramujo.

De facto, esta zona constitui, ainda hoje, uma frente ribeirinha da cidade de Almada profundamente desvalorizada, face ao papel social e urbanístico que o seu potencial, por todos reconhecido, impunha e impõe, que represente.

Reconhecemos a complexidade dos processos de transformação urbana e a pesada burocracia, associadas, em particular, aos Processos de Elaboração de Instrumentos de Gestão Territorial.

Apesar disso, relativamente àquilo que é, ainda hoje, a realidade no terreno deste nosso “Arco Ribeirinho” (da Quinta da Arealva ao Caramujo), é inevitável que se faça um balanço muito negativo de três décadas e meia de gestão CDU, sem escamotear, obviamente, as responsabilidades dos sucessivos governos do País (PS/PSD), em particular no caso em apreço: a vida e a morte dos estaleiros da Margueira, e a sua relação com a cidade de Almada e o seu governo.

Por isso, queremos aproveitar esta declaração para assinalar os bons e maus aspectos deste processo:

- É positivo que, sem esperar pela iniciativa do Estado, indiciada nos documentos legais que instituíram o Fundo Margueira Capital, a Câmara Municipal de Almada tenha resolvido dar início a um processo de planeamento urbanístico daquela zona, após o encerramento dos Estaleiros da Lisnave na Margueira.

- É positivo que não tenha restringido tal processo à área dos Estaleiros (55 ha) e que tenha definido uma área de estudo alargada (115 ha), de forma a poder enquadrar o restabelecimento das ligações da cidade com o rio, entre a Cova da Piedade e Cacilhas.

- É positivo que tenha sido lançado um Concurso Público Internacional para escolher a Equipa Técnica do Plano.

- É positivo que a metodologia de trabalho adoptada tenha dado importância e autonomia disciplinar à vertente ambiental da problemática em presença, através do Estudo de Caracterização Ambiental Geológica e Geotécnica (ECAGG), e que esta tenha podido informar a cenarização em que assentam as bases do Plano de Urbanização.

- Ainda do ponto de vista metodológico, é positivo que os mecanismos de participação adoptados tenham incluído o envolvimento dos actores - chave e das entidades da Administração Central, embora lamentemos que nunca se tenha pensado na integração deste órgão, através da Comissão de Acompanhamento da Requalificação de Cacilhas, nessa equipa plural.

Mas vejamos como decorreu este processo:

- A Equipa de Projecto assinou o contrato em Outubro/2002. Decorreu entre 2003 e 2005 a fase a que poderemos chamar de semi-pública da elaboração do Plano. Isto porque, quanto à Participação das pessoas, neste como em todos os outros processos de natureza semelhante desencadeados pela Câmara nos últimos anos, estamos muito longe do mínimo aceitável e a “milhas” do que achamos necessário, como aconteceu com o Plano de Pormenor da Quinta do Almaraz / Ginjal, projecto sobre o qual já aqui nos pronunciámos.

- Neste processo, os chamados Fóruns de Participação que, na melhor das hipóteses, podemos considerar de informação ou divulgação, decorreram até 2005, tendo-se realizado o último ainda antes do envio do processo para recolha dos pareceres da Administração Central através da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR-LVT).

- Até Julho de 2009, nunca mais se ouviu falar deste Plano. Atrevemo-nos mesmo a afirmar que haverá nesta Assembleia, a terminar 4 anos de mandato (2005-2009), autarcas que não o consultaram ainda, se calhar até mesmo os que fazem parte da inoperante Comissão de Acompanhamento da Requalificação de Cacilhas (alguns porque nem sequer tiveram qualquer oportunidade para o efeito, bastando para isso terem estado de férias entre meados de Julho e meados de Agosto). Que dizer, então, dos cidadãos das freguesias de Cacilhas e da Cova da Piedade, do concelho de Almada e até da região?

- A chamada “discussão pública” do Plano decorreu, assim, de 17 de Julho a 17 de Agosto, período em que a documentação técnica, extensa e complexa (centenas e centenas de páginas e dezenas de peças desenhadas) foi “disponibilizada”, isto é “depositada”, nos Serviços Técnicos da Câmara e nas sedes das Juntas de Freguesia implicadas (Cacilhas e Cova da Piedade), durante as horas de expediente, isto é, das 9h às 17:30h, e sem possibilidade de alargamento excepcional pós-laboral, obrigando a que os interessando tivessem de faltar aos seus empregos (como aconteceu com a representante do BE nesta Assembleia) para se deslocarem aos locais em causa.

- Colocação de inexplicáveis entraves burocráticos à cedência de reproduções dos documentos, impedindo as Juntas de Freguesia de fornecerem fotocópias aos interessados e exigindo que se fizesse um pedido por escrito à presidente da Câmara, o qual demorou mais de uma semana a ser respondido esgotando, entretanto, o tempo útil para analisar a documentação, embora tenham sido facultados, em formato digital, escassos três dias antes do término do prazo, todos os documentos integrantes do processo, ou seja, algo que deveria ter sido logo preparado com antecedência para responder, atempadamente, às solicitações dos munícipes assim que eles manifestassem esse desejo;

- Neste período, a referida documentação foi “consultada”, de acordo com o Relatório de Ponderação agora divulgado no sítio online da Câmara por 15 (somente quinze) cidadãos/entidades (entre os quais se encontra a representante do Bloco de Esquerda nesta Assembleia), e deu azo a 3 (três, apenas) participações escritas, sendo uma delas a do BE, e mais uma que entrou fora do prazo estipulado.

Relativamente a um processo de tamanha importância e complexidade, e no contexto de tantas e tão significativas decisões anunciadas para a nossa Região (como sejam o Novo Aeroporto, a 3.ª Travessia do Tejo, o TGV, a Plataforma Logística do Poceirão, a revisão do Plano Regional de Ordenamento do Território da Área Metropolitana de Lisboa, PROT-AML, o Projecto do Arco Ribeirinho Sul e a revisão do Plano Director Municipal, PDM de Almada), somos forçados a concluir que tão escassa participação só pode ficar a dever-se à falta de visibilidade do processo durante os últimos 4 anos.

Este facto é, em primeiro lugar, responsabilidade do Executivo da CMA, mas não escamoteamos a quota-parte de responsabilidade do Governo, nomeadamente no que toca à articulação do Plano de Almada Nascente com o Projecto do Arco Ribeirinho Sul, aprovado pelo Concelho de Ministros também em Julho de 2009 e publicado no Diário da República em Agosto, sem que até hoje tenha havido qualquer explicação pública sobre o assunto.

A este propósito, refira-se que consideramos absolutamente inaceitável que tenha sido proposta a votação final do Plano de Urbanização de Almada Nascente na Assembleia Municipal realizada no dia 18 do corrente mês, a última sessão do actual mandato autárquico, sem que tenha havido um esclarecimento cabal da articulação entre estes dois processos, questão que levantámos na nossa participação escrita na Discussão Pública do PUAN, e que não mereceu qualquer resposta por parte da Câmara, a não ser uma vaga referência à autonomia do PUAN enquanto Instrumento de Gestão Territorial, da qual obviamente estamos cientes.

No entanto, esta constatação não nos descansa relativamente à compatibilidade do que ambos os processos determinam para o território dos Estaleiros da Margueira, que é um e o mesmo, no Plano de Urbanização Municipal e no Plano Estratégico do Governo.

Bem sabermos que a senhora presidente considera a Discussão Pública agora ocorrida “uma mera formalidade”, como afirmou recentemente num debate televisivo, mas a falta de conhecimento e debate público da versão final do Plano de Urbanização de Almada Nascente e as muitas dúvidas que suscita a leitura do recém-publicado Plano Estratégico do Arco Ribeirinho Sul, justificariam, só por si, que o PUAN não tivesse sido aprovado em fecho de mandato.

Na nossa opinião, ter colocado a Assembleia Municipal perante a obrigação de votar o PUAN no passado dia 18, tratou-se de uma intencional e deliberada precipitação da Câmara que deixou aquele órgão colegial na ingrata e pouco digna posição de exercer uma das suas mais importantes competências (a aprovação de Instrumentos de Gestão Territorial e Planos Municipais de Ordenamento do Território) sem que a maioria dos seus autarcas tivessem conhecimento aprofundado da versão final do Plano e de outras matérias conexas da maior relevância, como é o Projecto do Arco Ribeirinho Sul!

Esta atitude do actual executivo acaba por demonstrar, como noutros casos que têm vindo a acontecer amiúde nos últimos tempos, um total desrespeito pelo funcionamento institucional da Assembleia Municipal chegando o executivo ao ponto de não acatar, expressamente, as suas deliberações, como no caso da aprovação do mapa de pessoal para 2009 cujas dotações têm sido largamente ultrapassadas sem autorização para o efeito, revelando a CMA, com este comportamento ilegítimo, uma total desconsideração pelos membros daquele órgão autárquico que o Bloco de Esquerda não pode deixar de aqui condenar.

Em contrapartida, ouvimos a Senhora Presidente da Câmara dizer na mesma Assembleia Municipal no dia anterior (17 de Setembro) que “não é em final de mandato” que se tomam decisões sobre as propostas que os comerciantes têm para o centro da cidade, e que só depois das eleições elas iriam ser analisadas.

O Bloco de Esquerda considera que não é em fim de mandato, e muito menos nas condições atrás referidas, que se decide sobre o futuro de uma zona tão importante para a freguesia de Cacilhas, o concelho de Almada e a região, e para as pessoas que dela possam vir a usufruir, como é o caso da zona abrangida pelo Plano de Urbanização de Almada Nascente e, por isso mesmo, absteve-se na respectiva votação e dessa decisão, assim como dos fundamentos que a suportam, não podia deixar de aqui vir dar notícia.

Cacilhas, 22 de Setembro de 2009

A Representante do Bloco de Esquerda,
Maria Ermelinda Toscano

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