quarta-feira, outubro 04, 2006

É isto o "trabalho exemplar" do PCP?

Entre as várias competências da Assembleia de Freguesia, consignadas no artigo 17.º da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro (com as alterações introduzidas pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de Janeiro), temos a incumbência de «acompanhar e fiscalizar a actividade da junta, sem prejuízo do exercício normal da competência desta», de uma forma casuística, posterior à respectiva prática dos actos, cabendo aos seus membros, «em qualquer momento», «solicitar e receber informação, através da Mesa, sobre assuntos de interesse para a freguesia e sobre a execução de deliberações anteriores».

E uma das atribuições que cabem ao órgão executivo da freguesia, nos termos do artigo 34.º da supra citada lei é, precisamente, «executar e velar pelo cumprimento das deliberações da Assembleia de Freguesia», sendo o respectivo Presidente aquele a quem é atribuída essa tarefa específica «sempre que para a sua execução seja necessária a intervenção da Junta», devendo «responder, no prazo máximo de 30 dias, aos pedidos de informação formulados pelos membros da Assembleia de Freguesia através da respectiva Mesa» (artigo 38.º).

Face ao exposto, a Assembleia de Freguesia de Cacilhas deliberou, na reunião de 27 de Junho de 2006, fosse «verificada a conformidade legal» do envio de postais de aniversário e cartas de saudação aos eleitores recenseados na freguesia, e se informasse a população, «através de edital, da respectiva autorização da Comissão Nacional de Protecção de Dados, concedida para o efeito, nos termos do estabelecido na Lei n.º 67/98, de 26 de Outubro». Não esquecer que a bancada da CDU votou contra este acto normal de fiscalização, alegando que era “uma farsa” e uma “grande suspeição”, apesar de a mesma ter surgido na sequência das dúvidas legítimas e fundamentadas acerca da utilização indevida que a Junta fizera da base de dados do recenseamento eleitoral para recolher os elementos identificativos dos fregueses.

Naquela mesma reunião, Carlos Leal, Presidente da Junta de Freguesia de Cacilhas, informou os presentes que recorrera, efectivamente, àquela base de dados, embora considerasse desnecessária a pré-autorização da Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) e nunca tivesse admitido que cometera uma ilegalidade: «politicamente é um acto que eu assumo claramente a minha responsabilidade. Se violei a lei, não sei se violei, a base de dados que usei de facto é da base do STAPE, mas não foi crime nenhum…», posição que fora precedida pelo apoio da sua bancada (a CDU) cujo representante, Pedro Noronha, até fez questão de frisar que «há quem entenda que a lei é para ser cumprida e há quem entenda que a lei serve para ser violada sempre que se possa e lhe sirva os interesses.»

O certo é que, todavia, em 14/07/2006, Carlos Leal informa a Assembleia de Freguesia que o executivo decidira «suspender, de imediato, o procedimento em prática» e «solicitar parecer às instituições/entidades com competência neste tipo de matéria», o que se presume terá vindo na sequência da opinião veiculada pelo seu partido, o PCP, cujo Grupo Parlamentar se pronunciara sobre o assunto dizendo que: «as comissões recenseadoras têm ainda acesso à informação constante na BDRE relativa ao seu universo eleitoral através da cedência, pelo Secretariado Técnico de Apoio ao Processo Eleitoral (STAPE), do respectivo ficheiro informatizado. Os condicionalismos necessários à viabilização do acesso devem ser definidos pelo STAPE, ou pelas comissões recenseadoras, conforme os casos, mediante prévio vinculativo da Comissão Nacional de Protecção dos Dados. (…) O presidente da Comissão Recenseadora é responsável pelo ficheiro informatizado dos eleitores e todos os que, no exercício das suas funções profissionais, tomem conhecimento dos dados pessoais inseridas na base, ficam obrigados ao sigilo profissional, nos termos da legislação em vigor de protecção dos dados pessoais.»

Embora, em entrevista ao Jornal da Região – Almada, de 17/07/2006, Carlos Leal assuma uma aposição contrária: «Confiante de que “não está a ser cometida qualquer ilegalidade”, o presidente assegura que vai continuar a enviar mensagens aos munícipes. “Não faz mal a ninguém enviar mensagens de aniversário ou primeira inscrição”.»

E, mais ainda, denotando um perfeito desconhecimento da lei sobre o funcionamento dos órgãos autárquicos, Carlos Leal afirma que a moção sobre protecção de dados pessoais «não vincula nenhum executivo», esquecendo-se de que o texto daquele documento não era meramente informativo, como confessa ao jornalista, mas continha uma deliberação que foi aprovada na Assembleia de Freguesia.

Por isso, quando, na última reunião do órgão deliberativo, de 27/09/2006, questionámos o Presidente da Junta sobre o parecer da CNPD que, supostamente, teria sido solicitado em Julho, e fomos informados, de forma lacónica, que o mesmo não existia porque não fora, ainda, sequer solicitado, o Bloco de Esquerda já estava à espera disso e, apesar de lamentar que assim tenha sido, não ficámos surpreendidos com o facto de não nos terem apresentado quaisquer razões justificativas para tal ocorrência.

Ou seja, é pública e evidente a intenção deliberada do Presidente da Junta de Freguesia, Carlos Leal (desconhecemos se com, ou sem, o aval dos restantes membros do executivo - uma coligação entre a CDU e o PSD), em não cumprir uma deliberação da Assembleia de Freguesia, assumida em 27/06/2006, nem tão pouco de respeitar uma decisão do próprio executivo, comunicada ao órgão deliberativo em 14/07/2006.

Perguntamos:

1. É isto «o trabalho exemplar do PCP em todas as instâncias do poder autárquico (…) sempre no cumprimento das regras e leis em vigor», como é referido na carta que o Grupo Parlamentar daquele partido envia a uma cacilhense que fez o favor de nos fazer chegar cópia da mesma?

2. Será que o Presidente da Junta pensa que por ter escrito que ia suspender o “procedimento em prática” isso torna irrelevante a solicitação do parecer que ele próprio diz que o executivo deliberou fosse requerido «às instituições/entidades com competência neste tipo de matéria» (que, neste caso, só pode ser a CNPD)?

3. O silêncio da CDU quererá significar que o executivo está consciente do grave lapso que foi cometido e, por isso, como não pensam voltar a incorrer na mesma ilegalidade, julgam que deixou de fazer sentido solicitar uma autorização que sabem de antemão seria negada?

4. Então, porque razão o Presidente da Junta, quando questionado pelo Bloco de Esquerda na Assembleia de Freguesia de 27/09/2006, não colocou tudo “em pratos limpos” e, de forma clara e transparente, informou os presentes sobre os motivos desse atraso e/ou recusa em contactar a CNPD?

5. Se é verdade que o PCP desenvolve um trabalho político sério em defesa de «uma sociedade justa e democrática, sempre sujeito ao enquadramento constitucional e legal português», o que faz esse partido, ao que tudo indica, desculpabilizar, em vez de responsabilizar, quem de entre os seus membros comete falhas que, se fossem outros a fazê-lo, já teriam sido bastante céleres em pedir a sua justa condenação?

Ponderando a existência de algumas atenuantes, nomeadamente a bondade dos objectivos sociais do acto praticado (que nos deixam, todavia, sérias dúvidas quanto à pureza da sua essência, dada a arrogância com que o Presidente da Junta de Freguesia insiste em não se retratar, muito pelo contrário), e apesar de já ter sido suspenso o envio de postais e cartas (que, acreditamos, tenha realmente acontecido), o certo é que foi cometido um crime de utilização indevida da base de dados do STAPE, o que ninguém pode nem deve esquecer sob pena de criar nos infractores a ideia de que, façam o que fizerem, são inimputáveis (não por demência mas por ausência de vontade dos responsáveis, em aplicar a lei).

Além de que, com essa atitude de aparente indiferença (à espera que o assunto caia no esquecimento?), pretendem enfraquecer a posição do Bloco de Esquerda na Assembleia de Freguesia de Cacilhas, onde facilmente será classificado como um partido que levanta problemas inconsequentes apenas para desestabilizar o normal funcionamento da autarquia e impedir que se discutam os problemas reais da freguesia, transformando os prevaricadores em vítimas do ímpeto legalista da eleita do BE.

Lamentavelmente, a verdade é que, depois da sobranceria com que a CDU tem abordado este assunto, nada nos assegura que não tenham havido outras utilizações nem tão pouco temos quaisquer garantias de que, no futuro, não venham a ocorrer abusos semelhantes para fins políticos, de efeitos menos visíveis e quase impossíveis de provar factualmente a não ser por denúncia directa, como seja a distribuição de “propaganda selectiva” dirigida a quadrantes específicos da população em período eleitoral, dando uma clara vantagem a quem detém essa informação em detrimento das outras forças partidárias que não têm esse conhecimento.

Mesmo na hipótese de aquele acto poder ter sido praticado sem a consciência de que se estava a violar a lei (embora seja caricato, e indesculpável, um órgão executivo, com o apoio da respectiva bancada no órgão deliberativo, onde existem pessoas com formação académica superior na área do direito, mostrar uma tão grande ignorância da legislação) isso não isenta de culpa quem o praticou, mais ainda quando nem sequer existe uma qualquer manifestação de arrependimento. Da mesma opinião foi o legislador ao determinar que a simples tentativa e a negligência fossem igualmente puníveis (artigo 40.º da Lei n.º 67/98, de 26 de Outubro) e não apenas a prática do acto em si, como aliás fica aqui provado que aconteceu no presente caso.

O que significa que o executivo da Junta de Freguesia de Cacilhas, mesmo tendo já suspendido a prática abusiva que cometeu, não cumpriu o dever de notificar, previamente, a CNPD da utilização que fez da base de dados do STAPE (artigo 27.º) pelo que, além do defeituoso cumprimento de uma obrigação legal, punível com a pena de contra-ordenação (previsto no artigo 37.º), utilizou dados pessoais (nome, morada e data de nascimento), de forma incompatível com a finalidade determinante da sua recolha (exclusivamente fins de recenseamento eleitoral) e sem condições de legitimidade adequadas, porque não tinham o consentimento inequívoco dos seus titulares (artigo 6.º), podendo os seus membros, em particular o Presidente da Junta, incorrer na prática de crime punido com a pena de prisão, ou multa até 120 dias, se for provada a intencionalidade com que agiram (artigo 43.º).

Artigos relacionados:
Notícia do Jornal O Mirante
Carta da CNPD
Moção aprovada
Requerimento 1
Declarações da CDU
Esclarecimentos do BE
Declarações do Presidente da Junta
Notícia do Jornal da Região – Almada
Carta do Grupo Parlamentar do PCP
Requerimento 2
Notas sobre AF de 27/09/06

segunda-feira, outubro 02, 2006

Declarações de Carlos Leal

E, finalmente, as declarações do Presidente da Junta de Freguesia, Carlos Leal, após a leitura da Moção e do Requerimento sobre Protecção de Dados, apresentados pelo BE na reunião da Assembleia de Freguesia de 27/06/2006, das declarações de Pedro Noronha (CDU), Odete Alexandre (PS), Miguel Salvado (PSD) e dos esclarecimentos de Ermelinda Toscano (BE):

«Eu já recebi do Governo do PSD, do Governo do PS, do Chefe do Governo, dos Governos anteriores, cartas em minha casa que eu não autorizei que escrevessem para mim, a dizer que participe... desculpe lá, alguém usou a minha morada e o meu nome, eu recebi cartas, eu estou agora aqui a tentar ridicularizar isto, porque ninguém autorizou o Chefe do Governo A, ou o Ministro B, ou o assessor Scollari ou o Senhor Gilberto Coelho da Federação de Futebol, a escrever para minha casa sem eu ter dado nenhum dado, alguém utilizou esta informação entre aspas privada para chegar até mim. Ou então empresas privadas, que querem vender serviços e produtos. E eu claro que não fiz queixa-crime contra o Governo, claro que não fui à Comissão de Dados, ri-me e rasguei o papel. Não fui à Comissão de Dados, não pus o Governo com uma queixa-crime contra ele e contra o Estado, porque violou a minha privacidade, portanto, isto para mim é… eu rasgo a carta e não tomo qualquer posição. Mas utilizei este exemplo, exactamente para comentar esta posição do BE, naturalmente que, de acordo com a Lei, eu tenho de responder à moção e já aproveito para dizer que a moção poderia ter outra forma que não aquela de moção, mas isso o meu colega da bancada já comentou esse aspecto, eu digo assim: reacções de Cacilhenses, só de felicitação. Ninguém até agora, nem presencialmente nem por escrito, nos fez chegar, ou de viva voz, ou por escrito: Senhor Presidente, ninguém o autorizou a escrever para minha casa. Pelo contrário, felicitam-me na rua ou escrevendo para a Junta, olhe parabéns, lembraram-se de nós, alguém se lembra de nós. E eu queria deixar isto aqui claro, portanto, impactos são positivos. Eu até agora nem da Dona Idalina, por facto dos postais, que vêm mais fotografias, questionou a Junta: Então quem é que o autorizou a utilizar aquela figura naquele postal. Nem nenhum freguês de Cacilhas me disse: Meu amigo, quem é que o autorizou, o Senhor está a abusar, o Senhor violou a minha privacidade pessoal, quem é o autorizou a escrever para minha casa no dia do meu aniversário? Só recebo felicitações, eu acho que isto, independentemente do aspecto legal e jurídico, tem que ser tratado, eu acho que sim, agora eu deveria era dizer assim, eu tenho é que felicitar esta Junta por ter tomado esta iniciativa que só custou à Junta cinquenta e três euros. Gastámos cinquenta e três euros no papel e no tonner, pronto, já agora fica com esta informação que fica acrescentada à questão colocada pelo BE, agora, o que é que foi enviado, foi enviado uma felicitação em nome do executivo assinada por mim no sentido de felicitar as pessoas que se transferiram para a Junta ou que tomaram a iniciativa pela idade de serem recenseados. Porque a crise é grande e eu mensalmente meço os resultados, os indicadores, relativamente ao débito entre os mortos e os transferidos para fora e os transferidos para cá e os novos recenseados. Eu estou preocupado com isso, é uma questão política a questão do recenseamento eleitoral, e cada vez que há uma pessoa que chega a Cacilhas, ou porque é um jovem que se quer recensear ou porque chega cá vindo de outro lado, já está recenseado, eu só tenho de felicitar. Politicamente é um acto que eu assumo claramente a minha responsabilidade. Se violei a Lei, não sei se violei, a base de dados que usei de facto é da base do STAPE, mas não foi crime nenhum, porque eu não fiz crime, eu felicitei um acto de uma pessoa que decidiu, um jovem sobretudo, decidiu recensear-se. Então isto não é de louvar? Ou é de omitir? Politicamente, eu não brinco em serviço. Portanto, eu acho que não cometi nenhum crime, custou muito pouco ao orçamento da Junta, cinquenta e três euros e setenta e nove cêntimos. Portanto, acho que entre o dever e o haver, eu acho que a gente somos mais credores do que devedores. Em relação aos aniversários, é um acto também politico naturalmente, que é saudar; felicitar por mais um ano de vida de uma pessoa que passou mais um ano da sua vida. Se calhar vou pensar se não mandarei em relação os mortos, por acaso meditei isso, mas decidi: vou felicitar a vida e não a morte. São aqui decisões que eu ponderei, e que eu acho que com toda a preocupação técnico-jurídica ou legal que o BE provocou eu acho que a intenção é que vale. Na minha posição a Junta não teve intenção voluntariamente de violar a legislação e muito menos de violar a privacidade das pessoas. E repito, até agora ando em Cacilhas todos os dias, vou à Junta todos os dias, nem uma carta de repúdio, de recriminação, nem uma palavra na rua de repúdio ou de recriminação, pelo contrário, posições de felicitação pelo acto em si e nem me pedem contas se isto é caro ou não é caro. Eu acho que devo dar esta explicação frontalmente a esta Assembleia, agora naturalmente se a Assembleia de Freguesia eventualmente votar a moção, no sentido de repudiar a decisão da Junta, a Junta submete-se à decisão da Assembleia de Freguesia, como democracia que é. Agora é uma decisão que os senhores eleitos dos grupos da Assembleia de Freguesia que deverão considerar. Houve uma senhora que na sequência do cartão de felicitação, ofereceu um bolo à Junta.» (destaques nossos) - páginas 18 e 19 da Acta n.º 2/2006, de 27/06/2006, aprovada na Assembleia de Freguesia de Cacilhas realizada no dia 27/09/2006.

Tal como nas declarações do líder da bancada da CDU, Pedro Noronha, fica aqui evidente neste discurso do Presidente da Junta de Freguesia Carlos Leal:
1.) O total desconhecimento da lei sobre protecção de dados pessoais, recenseamento eleitoral, direitos de autor e funcionamento dos órgãos autárquicos;
2.) O desrespeito pela Constituição da República e pelos princípios nela consagrados, nomeadamente os do artigo 35.º (sobre a utilização abusiva de bases de dados);
3.) A assunção de uma atitude prepotente, de quem se julga inatingível e não admite que errou, e ainda quer receber louvores por violar a lei.

Comportamento este que é imperdoável no representante de uma entidade da Administração Pública Local, porque desprestigia o cargo que ocupa (Presidente de uma Junta de Freguesia e, supostamente, um digno defensor dos direitos dos cidadãos da sua freguesia) e acaba por contribuir para o descrédito da imagem dos autarcas do seu partido (o PCP) junto da população local: uma pessoa que admite actuar por convicções pessoais e satisfazer meros interesses partidários, mesmo que violem a lei, ou seja, que não olha a meios para atingir os objectivos pretendidos, desde que obtenha dividendos sociais (o reconhecimento popular) e, sobretudo, políticos (maior número de votos) não pode ser merecedor da nossa confiança enquanto autarca, sobretudo ao preferir insistir na prática abusiva, defendendo-se com a legitimidade social do acto, em vez de ter a humildade suficiente para reconhecer que, se de facto agiu de boa fé como nos quer fazer crer, há que agir em conformidade (no discurso público e na prática diária enquanto edil).

Esclarecimentos de Ermelinda Toscano

Esclarecimentos adicionais (além do teor da Moção e do conteúdo do Requerimento sobre protecção de dados pessoais), apresentados por Ermelinda Toscano em representação do Bloco de Esquerda:

«Já que a questão da desconfiança se levantou e que no fundo, penso que, de uma forma um bocadinho… é melhor não classificar… acaba-se por estar a acusar o BE de estar a agir de má fé, eu tenho a dizer, como já disse e friso, em todas as reuniões, tenho quase vinte anos de trabalho num órgão autárquico, no qual sempre se fez questão de dizer que estamos num estado de direito e, em democracia, a Lei é para se cumprir. Portanto, se é para se cumprir, está bem ou está mal, nós contestamos nos sítios devidos. Acontece que, eu quando ouvi aquela comunicação na reunião da Assembleia de Freguesia, também não me meti logo a dizer fosse o que fosse, achei estranho, porque eu sei, além disso até tinha vindo na imprensa nesse mesmo mês, uns dias antes, uma notícia de um caso idêntico de um autarca de uma Junta de Freguesia do concelho de Ourém, distrito de Santarém, que a Comissão Nacional de Protecção de Dados dizia que, por ter usado os dados para enviar postais aos residentes na sua freguesia, poderia até ser constituído um processo-crime, ou uma contra-ordenação, eu dou apoio a uma Assembleia Distrital que é, logo por azar, a de Santarém, e tenho lá o jornal “O Mirante” que foi onde saiu essa notícia, e fiquei alerta. Não é por desconfiar, foi porque, por coincidência, eu trago aqui a notícia se duvidam das minhas palavras. E está a ver, isto saiu no dia doze de Abril, a reunião foi no dia vinte e seis de Abril, só que eu antes de dizer fosse o que fosse nessa reunião, eu não me manifestei, achei por bem que deveria saber mais informações a quem de direito, consultar a lei porque eu não a tinha de momento, saber uma série de informações até poder trazer o assunto à Assembleia de Freguesia. Para verem que a questão não se trata de desconfiança, eu perguntei à Comissão Nacional de Protecção de Dados uma série de informação. Recebi, e posso facultar, a resposta da Comissão Nacional de Protecção de Dados no dia vinte e dois de Maio de dois mil e seis.» Passou a ler (Anexo 6).

E continuou a intervenção, dizendo: «Eu não fiz queixa à Comissão e vim aqui, na sede própria, colocar os devidos esclarecimentos. Só por isto, a lei existe é para se cumprir. Se acham que não é assim, é a Assembleia que assim delibera nesse sentido, mas eu voto contra deliberar, achar que isto está tudo bem. E tenho dito.» - página 16 da Acta n.º 2/2006, de 27/06/2006, aprovada na Assembleia de Freguesia de Cacilhas realizada no dia 27/09/2006.

Declarações de Pedro Noronha

Justificações apresentadas por Pedro Noronha, em representação da bancada da CDU, para explicar o voto contra a aprovação da Moção do BE sobre «Protecção de Dados Pessoais»:

«Eu sei que quem tem a preocupação de investigar, enfim de descobrir os segredos e remexer nestas coisas, não tem nada de negativo esse aspecto, no entanto, a posição da bancada da CDU, e da nossa formação é a de partirmos das bases da confiança, quando temos razões para desconfiar, desconfiamos. Avançamos com confiança e com reservas e com cuidados. Acho que é a posição correcta perante as outras pessoas e que não sentimos minimamente justificação nenhuma para uma moção como esta que o BE põe. Porque se compreende isso, haveria as suspeições ou razões para suspeições e que eventualmente o BE terá e se tiver então também as deve pôr, para que percebamos o porquê de uma moção destas. Naturalmente, que quando uma entidade ou a Junta de Freguesia, tem dados, eles vão servir para alguma coisa, não são para meter numa caixa aferrolhada donde não saem para coisa nenhuma. O que nós sabemos é que a Junta tem dados, obviamente as pessoas recenseiam-se e fornecem os seus dados e sabemos que os está a utilizar enviando a mim dados que a mim me dizem respeito e nada me diz que faz suspeitar que haja necessidade de recorrer a entidades superiores. Parece-me de certo modo, esta a preocupação da Lei. Já disse isto numa reunião e volto a dizê-lo porque são duas posições perfeitamente normais e vulgares: há quem entenda que a lei é para ser cumprida e há quem entenda que a lei serve para ser violada sempre que se possa e lhe sirva os interesses. Isto são posições opostas e ninguém morreu. Nota, a lei vale o que vale e vale o que vale em cada situação. A bancada da CDU deverá votar contra essa moção, contra a outra moção não votamos porque achamos que está correcta e nós não consideramos como fiscais de nada.» (destaques nossos) – página 15 da Acta n.º 2/2006, de 27/06/2006, aprovada na Assembleia de Freguesia de Cacilhas realizada no dia 27/09/2006.

Mais tarde, depois da intervenção de Ermelinda Toscano, em representação do BE, de Odete Alexandre, em representação do PS, de Miguel Salvado, em representação do PSD, Pedro Noronha voltou a pedir a palavra para esclarecer que: «Em relação à questão levantada sobre a minha posição sobre se a lei é para ser cumprida, eu disse que aquilo eram duas posições e não acusei nenhum partido. Aliás isso faz parte da prática dos advogados, porque hoje defendemos uma coisa, amanhã defendemos outra. Por isso é que todos dizem que os advogados são uns aldrabões. Mas eu não tomei posição nenhuma pessoal. Cada um percebe o que percebe e normalmente percebe o que quer perceber. Quanto à Moção, há aqui duas questões, eu diria que possivelmente há aqui uma grande divergência entre aquilo que o BE aparenta crer, que é ajudar e aquilo que contém a moção. Porque na moção não só fala das preocupações, poderia ser uma moção ou nem ser uma moção, era uma recomendação à Junta. Podia vir a ajudar o executivo a cumprir bem as suas funções, segundo a óptica do BE. A moção não é isso, é obviamente uma grande suspeição, e até já foi dito aqui, que pode ser crime e mais do que isso, pretende-se fazer a publicidade, dar publicidade por editais da autorização que a Junta eventualmente tenha tido. Portanto, isto é uma farsa e nós mantemos a nossa posição. Em relação a outro aspecto que não tem nada a ver com isto, mas que também é sobre o direito de autores da imagem, acho que é uma questão muito pertinente, e que eventualmente poderia ter trazido a autora, a pintora, a desenhadora, aqui a uma sessão pública para reclamar dos seus direitos, mas não vejo que nenhuma força política tenha capacidade, legitimidade para levantar essa questão, sem importância nenhuma par a freguesia, é tudo.» (destaques nossos) – página 18 da Acta n.º 2/2006, de 27/06/2006, aprovada na Assembleia de Freguesia de Cacilhas realizada no dia 27/09/2006.

Fica evidente neste discurso, proferido por um advogado é bom não esquecer:
1.) O total desconhecimento da lei sobre protecção de dados pessoais, recenseamento eleitoral, direitos de autor e funcionamento dos órgãos autárquicos;
2.) O desrespeito pela Constituição da República e pelos princípios nela consagrados, nomeadamente os do artigo 35.º (sobre a utilização abusiva de bases de dados);
3.) O ataque desprestigiante à classe profissional dos advogados;
4.) As acusações levianas sobre a actuação do Bloco de Esquerda, apesar da fundamentação legal apresentada e da resposta da Comissão Nacional de Protecção de Dados.

Ainda a Protecção de Dados Pessoais II

Ainda a propósito do “caso dos postais” que tanta celeuma causou na penúltima reunião ordinária da Assembleia de Freguesia de Cacilhas, realizada no dia 27 de Junho de 2006, não posso deixar de aqui transcrever, para conhecimento do público em geral, as polémicas declarações de Pedro Noronha (em nome da bancada da CDU na Assembleia de Freguesia) e de Carlos Leal (Presidente da Junta de Freguesia), assim como os meus esclarecimentos sobre o assunto (além do teor dos documentos que então apresentei e que já estão disponibilizados on-line), agora que a respectiva acta foi aprovada na última reunião daquele órgão deliberativo, que ocorreu no passado dia 27 de Setembro, sendo este, portanto, um documento público e cuja versão integral pode ser consultada por qualquer cidadão na sede da autarquia (Rua Liberato Teles, n.º 6-A, Cacilhas).

Assim sendo, começarei por postar as palavras do líder da bancada da CDU, advogado de formação, e que, por esse motivo, acabam por nos chocar ainda mais tal é o desconhecimento da legislação sobre a matéria de protecção de dados pessoais (uma das grandes batalhas do seu partido na Assembleia da República) e o evidente desrespeito pelos princípios fundamentais da democracia e defesa dos direitos dos cidadãos, consagrados na nossa Constituição: Pedro Noronha (CDU).
De seguida apresentarei os meus esclarecimentos: Ermelinda Toscano (BE).
E, finalmente, as declarações do Presidente da Junta: Carlos Leal (CDU).

Leiam tudo com atenção, analisem o respectivo conteúdo, sem esquecer o teor dos documentos relacionados (Moção sobre a Protecção de Dados Pessoais, Requerimento – apresentado em 27/06/2006, Artigo no Jornal da Região, Carta do Grupo Parlamentar do PCP, Ainda a Protecção de Dados Pessoais I – requerimento apresentado em 27/09/2006, nomeadamente) e façam o vosso juízo de valor sobre o assunto.